A Bet�nia ao tempo de Pilatos era a povoa��o mais desprez�vel de toda a Judeia. Os solos �ridos, as encostas ressequidas pelo sol inclemente e a amea�a permanente dos ataques de salteadores faziam daquele s�tio um rochedo in�spito e est�ril. Poucos a� paravam, se exceptuarmos as estadas fugazes de viajantes incautos a caminho da cidade santa de Jerusal�m ou alguma escumalha de reputa��o desgra�ada. Mas a vida tem o cond�o de florescer nos recantos mais improv�veis e mesmo um lugarejo daqueles albergou algumas das gentes not�veis do seu tempo. O mais not�vel de todos era um rabi chamado Jesus, que o povo conhecia por messias ou ungido, que em grego se diz christo ou cristo, e que fizera de Bet�nia a sua casa. A� era calorosamente recebido por Marta, Maria e o seu disc�pulo amado L�zaro. E para l� se dirigia agora, apressado e com o cora��o em sobressalto. J� h� muitas noites que as imagens do L�zaro crucificado lhe atormentavam o sono e, porque as pessoas da sua fam�lia tinham o h�bito de levar os sonhos a s�rio, resolveu fazer-se à estrada.
Chegado a Qumran, Jesus estava exausto. Precisava de alojamento e buscou ajuda junto dos mais pobres daquele lugar, porque sabia que os sentimentos de caridade eram mais robustos entre as pessoas de condi��o modesta. Acolheram-no uma camponesa e o marido cego, que compartilharam com o viajante desconhecido a modesta ceia de farinha e azeite. Agradecido, Jesus prometeu curar o velho do mal que lhe turvava a vista. Procedeu à recolha de ervas e com elas preparou um unguento que devolveria ao generoso anfitri�o a vis�o das coisas. O casal exultou de contentamento perante aquele milagre, mas Jesus ordenou-lhes que fossem discretos sobre a cura, que radicava apenas no seu conhecimento das ci�ncias naturais. Pediu ent�o um recanto para dormir mas o seu sono foi, mais uma vez, assombrado pelas imagens da crucifica��o do disc�pulo L�zaro.
Um grande rebuli�o despertou Jesus na manh� seguinte. Levantou-se de um salto e julgou que ainda sonhava quando viu serem arrastados pela popula�a em f�ria os corpos flagelados de dois homens. Perguntou à sua anfitri� que homens eram aqueles e porque urrava o povo, ao que a boa mulher respondeu que n�o eram homens mas eunucos e que ao cometerem juntos o pecado da carne atentaram gravemente contra as leis de Deus, pelo que os populares os levavam para serem apedrejados. Jesus ouviu estas palavras e, ainda que a autoridade da sua presen�a e o brilho das suas palavras pudessem ter salvo os dois desgra�ados, como j� antes tinha sucedido com uma puta de Magdala, nada disse e nada fez. Limitou-se a acompanhar a turba enfurecida que despeda�ava com as suas pedras os criminosos. E quando j� n�o havia mais pedras para arremessar, tudo o que restava daqueles dois era uma massa informe de carne e ossos.
Jesus chegou nesse mesmo dia a Bet�nia, mas Marta e Maria n�o o acolheram com as mesuras do costume. Levantavam, chorosas, as m�os ao c�u e lamentavam a sorte do pobre L�zaro, fulminado pela lepra. E porque temiam a propaga��o da doen�a, encerraram o irm�o na cripta. A� entrado, o rabi viu como toda a superf�cie do seu corpo se assemelhava a uma �nica e enorme �lcera e logo se apiedou dele. Conjurou todos os seus conhecimentos cient�ficos, preparou os rem�dios com as ervas que encontrara no caminho e cuidou das chagas do disc�pulo com o zelo e a do�ura de um pai. Ao d�cimo s�timo dia, j� um renovado L�zaro andava por seu pr�prio p�. Jesus falou-lhe ent�o do sonho que o fizera regressar a Bet�nia e L�zaro perguntou-lhe porque o tinha abandonado, ao que o mestre respondeu, choroso, como tinham sido insensatas as suas ideias de morrer pelos pecados dos outros. «Tu, L�zaro, � que me curaste». O jovem beijou-o ternamente nos l�bios e ali selaram com os seus corpos vigorosos o amor de um pelo outro. Partiram os dois para a localidade erma de Efrem, onde viveram, em amena felicidade, at� ao fim dos seus dias.